Viagem pelas ruas da amargura

"As viagens devem ser um instrumento à procura do fantástico,nunca o suporte de uma devoção complacente" - Baptista-Bastos

quarta-feira, junho 29, 2005

A "antecipação" faz parte do ruído

Transcrição, com a devina vénia, de um post de ontem no Abrupto, à consideração de todos os jornalistas portugueses:

" (JPP)

“ANTECIPAR” E GANHAR A BATALHA DA COMUNICAÇÃO

Um governo, um político habilidoso, “antecipa”. Antecipa o discurso, as medidas, antecipa o vazio como se estivesse cheio. Quando não se tem nada para “surpreender” ou para dizer de “novo” (outra obrigação comunicacional por cuja falta se é penalizado), ou se corre o risco de ter uma fuga que estrague a surpresa, mais vale “antecipar”.

“Antecipar” dá títulos melhores e dá os títulos que os autores da antecipação desejam. Incontrolados, incontroversos, porque não são confrontados com nenhuma realidade exterior, nenhuma opinião hostil, nenhuma crítica. Títulos bem independentes da realidade que se “antecipa”. Pode-se “antecipar" A e fazer Z, que a “antecipação” é mais poderosa. Um caso típico de “antecipação” foi a legislação sobre nomeações para os cargos políticos, que quando for aplicada já os tem todos nomeados.

Os jornalistas tendem cada vez mais a substituir a notícia pela antecipação, porque a “antecipação” foi só para eles, julgam, e para o seu jornal, julgam, enquanto a notícia pertence a todos. Logo, quando existe a notícia, a realidade daquilo que se antecipou, já tem muito menos interesse, nem “novidade”, nem “surpresa”. Já parece uma nuance e os jornais detestam nuances.

Com excepção de Deus, que pode antecipar o que quiser, e tem o melhor gabinete de relações públicas do universo, há uma regra muito humana que postula que entre o verbo e o acto, há o ruído. A “antecipação” faz parte do ruído."

terça-feira, junho 28, 2005

Dava jeito que fosse uma bomba?


Uma explosão e um prédio no centro do Porto pelos ares. Dois mortos.
Causas: gás?; cilindro?; bomba?
Pergunta ingénua: atendendo à pressa com que o senhor presidente da Câmara veio falar repetidamente na hipótese de um engenho explosivo, será que, politicamente, dava jeito a Rui Rio que fosse uma bomba?

sexta-feira, junho 24, 2005

Lindo!

sábado, junho 18, 2005

Gondomar não existe (2)



Há originalidades na democracia portuguesa que os livros de política e de história não deixam de assinalar. Mas se alguém se desse ao trabalho de fazer um registo do anedotário nacional não deixaria em branco uma referência ao “blog” de João Moura, candidato à Junta de Freguesia de Rio Tinto.

Pois bem, João Moura é candidato à Junta de Freguesia, pela terceira, quarta ou enésima vez, tanto faz. E decidiu aderir às novas tecnologias. Vai daí resolveu fazer um “blog”. Até aqui, tudo normal, João Moura limita-se a seguir as pisadas dos seus pares no PSD, que o apoia, no PS e por aí fora.

A originalidade de João Moura está nos seus escritos. O presidente da Junta de Freguesia de Rio Tinto não escreve, faz títulos. Exemplifico. “Qual o principal problema da Cidade de Rio Tinto?” , pergunta João Moura. Os cibernautas que estiverem para aí virados que o enunciem... “Rio Tinto na Vanguarda”, afirma João Moura. Os cibernautas que quiserem comentar que comentem... E o homem lá vai coleccionando os “comentários”.

Claro está que, depois, arrisca-se a comentários mais ou menos divertidos, como este de um tal António Monteiro, que passo a citar:

“TRES MANEIRAS - - - 2005-06-12
Há três maneiras de fazer um blog:
- o próprio se sabe escrever;
- um grupo de contratados se o próprio não sabe escrever
- os contratados se o que dá a cara pelo blog só sabe assinar
Cumprimentos não ao João as ao blog”

É uma originalidade, sim senhor, mas pelo lado da mediocridade.

Gondomar não existe. Ou será, antes, que quem lá vive não merece melhor sorte?

segunda-feira, junho 13, 2005

As mãos e os frutos

Eugénio de Andrade (1923-2005)



P.S.: estou para ver que tratamento vão dar os jornais, amanhã, à morte de uma lenda vida da nossa poesia contemporânea.

Até sempre, camaradas

Álvaro Cunhal (1913-2005)



P.S.: estou para ver que tratamento vão dar os jornais, amanhã, à morte de uma lenda vida da nossa história (independentemente do que possamos pensar sobre ela)

quinta-feira, junho 09, 2005

Pensamento

"Plantai amor, oh homens, se quereis colher amor"

Pai Américo, in "O Gaiato" n.º 1598, de 11 de Junho de 2005

terça-feira, junho 07, 2005

Testamento

Após a morte de Deus
abriremos o testamento
para saber
a quem pertence o mundo
e aquela grande armadilha
de homens.

Ewa Lipska, in “Rosa do Mundo, 2001 Poemas para o Futuro” (Assírio & Alvim), 2001

sábado, junho 04, 2005

O bastardo



Quem não é bastardo, nem se sente como tal, ouve o bastardo falar, na televisão, na rádio, todo o dia, e pensa: quem sente, é filho de boa gente.



Do Dicionário de Língua Portuguesa, da Priberam:
Bastardo – do
Fr. Bâtard – s. m., filho ilegítimo; tipo de caligrafia inclinada e cheia; casta de uva preta de bago miúdo e muito junto; ant., vela triangular de pequenas embarcações; moeda de 10 soldos; adj., ilegítimo; degenerado.

Da linguarejar madeirense:
Bastardo – o mesmo que alguns filhos da puta de jornalistas do Continente.

Força, Max!



Um em cada quatro dos jornalistas do distrito de Aveiro trabalha ilegalmente. A conclusão é do José Carlos Maximino, do “Max”, camarada de profissão, que hoje, às 21.30 horas, na Feira do Livro de Aveiro, lança o livro “Jornais e jornalistas da Grande Área Metropolitana de Aveiro”.

No prefácio, marcam presença, por razões diferentes, Marcelo Rebelo de Sousa, Alberto Arons de Carvalho e Costa Carvalho. Do trio destaco o belíssimo “Então, profacemos!”, prosa escorreita, límpida e forte como são todos os textos de Costa Carvalho.

“Diz Baptista Bastos que, depois de muitos anos de ofício, o normal será um jornalista acabar meio bêbedo, meio doido e meio divorciado. Ainda assim, lá vai conseguindo sobreviver. Agora, ao que o jornalista não resiste mesmo é à síndrome dos Lusíadas: iniciar a carreira com encanto (cantando espalharei por toda a parte) e pôr-lhe fim com desencanto (de cantar a gente surda e endurecida). Também para o jornalista, como tão poeticamente Ruy Belo escreveu, «é muito triste andar por entre Deus ausente»”.

O resto fica para quem comprar o livro...


P.S.: “Jornais e jornalistas da Grande Área Metropolitana de Aveiro” é, aparentemente, um trabalho de interesse circunscrito a Aveiro. Mas, pensando no alerta para o trabalho ilegal na profissão, pergunto: será que é mesmo só em Aveiro?

quinta-feira, junho 02, 2005

Como estamos de amores?



Diz o autor
Esta é uma peça que fala de relacionamentos. Mas, apesar do humor ácido que, por vezes, parece céptico, acredito que a principal mensagem deste texto seja que é preciso amar.
No entanto, para que qualquer relação tenha futuro, ela deverá ser construída sobre bases sólidas, sobre verdades.
E, no caso dos personagens desta trama, a verdade foi ocultada desde o início. Depois, o que ficou foram as acusações. E agredir não é exactamente a melhor forma de sermos sinceros. Ao contrário, é mais uma maneira de nos defendermos, levantando mais barreiras que nos deixam longe de revelar a verdade de nossa alma.
Espero, sobretudo, que vocês possam rir desses personagens patéticos que, apesar de necessitarem desesperadamente do amor um do outro, não aprenderam a pedir e, muito menos, a se entregar”.

Diz o encenador
Como vamos de amores?
Nem Laura nem Alberto têm a resposta. Sabem como estão de desamores, mas na vulgaridade do(s) seu(s) quotidiano(s) não encontram saída para as suas perguntas e as palavras passam a armas de arremesso.
Tudo é dorido e o humor, em vez de causar um sorriso, é como álcool sobre uma ferida: arde (mas não cura).
Claro que nada disto teria importância se as Lauras e os Albertos não se multiplicassem aos milhares. Neles estão todos os que sabem o que não têm, sem saborear o que construíram.
Ah, se a vida fosse como num filme!
Mas a vida não é uma ciência exacta, nem em Casablanca...”


Mais informações no Cale Estúdio Teatro, Rua do Meiral, 51, em V. N. Gaia (caleestudioteatro@portugalmail.pt)

O curto-circuito da Boavista



O dr. Rui Rio tem todo o direito de gostar de automóveis. E, por isso, quer reviver o famoso Circuito da Boavista. Eu também gosto de automóveis, também tenho esse direito. E, na altura própria, irei, ou não, ver as corridas.

Mas levar por diante um gosto pessoal com um arrepio assustador de obras, à revelia de todos os projectos aprovados, sem concurso público, contornando os habituais estudos de impacte ambiental – como, muito bem, ainda hoje, Rogério Gomes assinala em “O Comércio do Porto” –, isso não.

E depois do corre-corre alucinado para ter a “pista” pronta a tempo, os portuenses ainda vão ter de chupar outra pastilha: a desmontagem do circo antes das eleições autárquicas. Ou será que é mesmo para ficar tudo na mesma?

Mas os peões que se cuidem, para não entrarem em curto-circuito. Nem que tenham de esperar pelo autocarro no meio da rua...


Post-scriptum: o link de "O Comércio do Porto" não funciona directamente para o editorial de Rogério Gomes. Porque assim é, aqui fica o texto:

"O Grande Prémio não pode custar milhões à Câmara do Porto?

Os serviços de propaganda da Câmara Municipal do Porto insultam "O Comércio do Porto", acusando este jornal de mentir deliberadamente quando afirma que a recriação do Grande Prémio de Fórmula 1 no circuito da Boavista pode custar milhões à edilidade. Para lá da baixaria de o presidente da Câmara permitir (ou ordenar) que um texto deste teor seja publicado na página de Internet da edilidade, num espaço que devia ter outra dignidade que não a de órgão de propaganda do senhor presidente, o dr. Rui Rio teve oportunidade de responder a esta e a outras questões relativas ao mesmo assunto no final da reunião camarária de terça-feira. Como de outras vezes, quando as questões são um pouco mais difíceis ou está um pouco mal disposto, escusou-se.

É uma opção, mas seria de esperar que ontem, no exercício do seu direito mas também da sua obrigação, dissesse das suas razões, oralmente ou por escrito. Mais uma vez, pelo menos a O COMÉRCIO e apesar de questionado, disse nada. Preferiu deixar (ou ordenar) que um qualquer seu escriba fizesse aquela "obra prima" numa montra da edilidade.

Mas, adiante:
Os jornais de 18 de Novembro de 2004 noticiavam a abertura de um concurso público da empreitada para resolver o problema das inundações do parque de estacionamento do Castelo do Queijo, por parte da Empresa de Gestão de Obras Públicas da Câmara do Porto (GOP). Dizia a autarquia que a urgência da obra tinha a ver com a "proximidade do Inverno" e acrescentava que se aproveitaria ainda para avançar com a requalificação urbana da avenida, seguindo o plano de levar o metro avenida abaixo em direcção a Matosinhos.

Soube-se também que uma semana antes a Câmara do Porto, presidida pelo dr. Rui Rio, e a Metro do Porto, presidida em regime de substituição pelo mesmo dr. Rui Rio, tinham assinado um protocolo em que a Metro se compromete a aceitar e a financiar a obra de requalificação na avenida.

A oposição reage. Para Rui Sá (CDU), trata-se de pôr o "carro à frente dos bois", ao mesmo tempo que se queixa de que o projecto nunca foi conhecido da Câmara; por seu lado, Manuel Diogo (PS) releva a ausência de informação e critica a "forma autocrática como Rui Rio leva as suas ideias avante sem dar cavaco a ninguém", depois de questionar sobre se o presidente da Câmara "tem receio que a cidade conheça o que anda a fazer ou, então, não se percebe".

Fazendo a vontade à oposição, o presidente em exercício da Metro do Porto à altura, dr. Rui Rio, e o presidente da Câmara do Porto, o mesmo dr. Rui Rio, estiveram no dia 23 de Novembro passado na apresentação da futura linha "laranja" do Metro, que devia percorrer a Avenida da Boavista; na mesma sessão, Siza Vieira e Souto Moura assumiam o projecto de requalificação da avenida.

Como verificamos, em toda a comunicação da Câmara, até esta altura, nem sinal de Grande Prémio, de desfile de carros antigos ou de Circuito da Boavista...

Duas semanas depois (hélas!), o presidente da Câmara dr. Rui Rio anuncia as corridas do Circuito da Boavista - a recriação do circuito implicou alterações ao projecto de Siza Vieira e Souto Moura, "pequenas, na ordem dos 10 centímetros em termos de medidas de passeios ou vias", explicou o edil, que informou que tudo tinha sido pensado com antecedência para preparar a cidade para o regresso das corridas, garantindo ainda que "as obras de requalificação da Boavista estarão concluídas antes do final de Junho do próximo ano" a tempo portanto do Grande Prémio.

Manuel Diogo tinha, talvez inadvertidamente, posto a questão certa na reacção ao anúncio do concurso público - "não se percebe". De facto, sem a informação essencial, a da vontade de Rui Rio realizar o Circuito da Boavista, ninguém podia perceber nem o repentismo nem o aperto dos prazos definidos - Setembro seria, por exemplo compreendido face às eleições autárquicas... Agora, Junho!

Percebeu-se, finalmente, a urgência. E até ficaram para trás questões como o arranjo da Rua da Vilarinha, do troço final da Circunvalação e as obras para a segurança das corridas... Também não houve contestação séria à ideia. Afinal, o evento, na linha do tão criticado Euro 2004 pelo agora entusiasta dos carros antigos, pode dar visibilidade à cidade e atrair, durante um fim de semana que seja, as atenções para o Porto.

Ficou por resolver a questão do estudo de impacto ambiental, de que a Câmara se autodispensou e que o Instituto do Ambiente - ainda no anterior Governo - exigiu.

Mais uma vez veio a "cereja no bolo". Embora já fosse certo desde o protocolo CMP/MP de Novembro, em Março deste ano oficialmente repetiu-se que os custos dos trabalhos de requalificação da Boavista seriam pagos pela Metro, desde que o projecto de levar a "linha laranja" pela avenida fosse avante... Os presidentes da Empresa da Metro do Porto e da Câmara do Porto ainda eram os mesmos: o dr. Rui Rio e o dr. Rui Rio.

Infelizmente, o Governo de Santana Lopes não deixou aprovado o projecto da linha da Avenida da Boavista e, aparentemente, o Governo PS não lhe é muito favorável.

E o financiamento com que a Câmara do Porto estava a contar pode não existir. E os cofres da Câmara vão ter que aguentar com o custo da obra da requalificação da Boavista.

Então senhor presidente da Câmara, nada disto tem a ver com o Grande Prémio? A urgência do concurso e da obra, a pavimentação que, nos planos da Câmara e do Metro, será preciso voltar a levantar, pelo menos na zona dos carris para as composições, as "pequenas" modificações ao projecto de Siza Vieira e Souto Moura, a retirada dos carris do viaduto junto ao Edifício transparente, a oportunidade da requalificação da Rua da Vilarinha, as obras na Circunvalação, etc, etc. O Grande Prémio não pode custar milhões à Câmara do Porto?"

quarta-feira, junho 01, 2005

Versão da fábula "Os ratos reunidos em conselho"

Em tempos, o meu camarada Júlio Roldão deixou-me na secretária um print de um texto magnífico. Por mero acaso, encontrei-o hoje, e não resisto... Aqui fica a reprodução com a devida vénia para o seu autor, que desconheço:


Versão da fábula “Os ratos reunidos em conselho” de João de Deus Ramos

Algures, entre muitos gatos
Um havia
Que era, segundo a fama que corria,
O mais temido caçador de ratos.

Focinho de arreganho,
De grande rabo
E de eriçado pelo,
Para o murganho
Vê-lo,
Era do diabo!....

Nenhum rato caía na tolice
De sair, sem cautela, do buraco,
Por mais fraco
Que o estômago sentisse.

Não, porque ele era o espectro, era a tortura
Que rala, que aniquila, que consome!
Ele era a fome
E a sepultura!

O caçador, porém, não era monge;
E numa linda noite de luar
Soube-se no lugar
Que andava longe…

Então,
(Vejam aqui os homens neste espelho
Como eles, fúteis, tantas vezes são)
Os ratos reuniram em conselho.

Diziam: - Isto assim não pode ser;
Antes a morte que tal sorte:
Passar dias e dias sem comer!

E logo alvitrou um, com alvoroço:
-Sabem o que é preciso?
É pôr-lhe um guiso
Ao pescoço…
Com um guiso ele próprio nos previne…
Muito embora no chão se agache e roje,
Ao menor movimento o guiso tine,
E a gente foge…

-Bravo! - gritaram todos – muito bem!
É assim mesmo! Assim!
Mas quem há-de ir atar o laço? Quem?

Eu não, que não sou tolo! – afirmou um.
Nem eu – disse outro. E enfim,
Não foi nenhum.

Há destes casos neste mundo a rodos;
Se é preciso coragem numa acção,
Todos concordam, ninguém diz que não,
Mas chegado o momento, faltam todos!

Não! (2)

Passeios pelo Porto

O jornalista Germano Silva lança, na próxima sexta-feira, às 21.30 horas, na Biblioteca Municipal Almeida Garrett, no Porto, "Passeios pelo Porto de outros tempos", livro que reúne um conjunto de crónicas que pretendem ajudar o leitor a gostar mais da cidade.

O Porto de que fala Germano Silva já não existe, mas é bom saber que ainda há quem tenha memória desse outro Porto e escreva sobre esse outro Porto de forma militante.

Manuel António Pina faz a apresentação.

Duas razões de sobra para exercitarmos o gosto pelas coisas simples.