Viagem pelas ruas da amargura

"As viagens devem ser um instrumento à procura do fantástico,nunca o suporte de uma devoção complacente" - Baptista-Bastos

sexta-feira, abril 28, 2006

A eternidade por 1500 euros

Com a devida vénia à sua autora, reproduzo um belíssimo texto na sequência da fúnebre polémica que, por estes dias, agita Rio Tinto.

Parabéns, Helena, a coisa vista com olhos forasteiros ganha em perspectiva.

A eternidade por 1500 euros

Em Rio Tinto discutem-se os direitos de ocupação do cemitério. A Junta de Freguesia oferece duas alternativas: sete anos com uma taxa de 35 euros renovável por duas vezes ou 1500 euros para alcançar a eternidade. Será o preço-privilégio para quem quer ter num terreno há muito lotado a morada eterna. Quem não tem dinheiro revolta-se. Acha que é uma perseguição aos pobres. Em Portugal, a casa dos mortos é tão importante como a casa dos vivos. As flores têm que estar frescas e viçosas; os afectos tanto faz. O cemitério está inundado de mulheres contratadas para tratar das campas dos outros.

O coveiro, que enterrou milhares de pessoas durante trinta anos e também a mulher, ri. Diz que ri para não dizer tudo o que já viu. E sentiu na pele desde que enviuvou. "Nunca um filho me enviou um tostão para comprar uma flor para a mãe", diz a apontar as mãos ao céu. Hoje é a mulher que lava as sepulturas dos outros que toma conta dele e dos seus 78 anos. Não se queixa. Construíu a casa, avaliada em 25 mil contos, com as gorjetas que ganhou nos funerais e assegura que tem muito mais do que 300 contos amealhados. Só não tem a mulher. Fica ali com a outra, os dois sentados nas escadas do cemitério a recordar os que partiram: os que pediram para ser sepultados na extremidade mais próxima de um café para poderem continuar a pedir copos ao empregado; os que imploraram para não ser enterrados no cemitério onde se dizia que andava o diabo; os que foram apanhados desprevenidos e novos demais. O coveiro continua a rir. Já não enterra mortos. "Cansei-me". Mas continua a vesti-los. "Medo?", volta a rir. "Medo é dos vivos e mesmo desses...

quinta-feira, abril 13, 2006

Com os votos de uma santa Páscoa!

sexta-feira, abril 07, 2006

E a manada com a voz cada vez mais calada

Revoltam-me algumas informações dos últimos dias – informações?, imposições unilaterais!. Invocam-se mentiras, é como baralhar e dar de novo, discrimina-se com livre arbítrio, e manda quem pode como quer e lhe apetece. É como um jogo de futebol que tem, antes de começar, o resultado combinado: de um lado está a equipa vencedora e o árbitro, do outro quem perde, sempre os mesmos, cada vez mais cheios de medo, acocorados e acobardados, cada um a suspirar para que não chegue, ainda, a sua vez…

Merda! – digo eu. Merda! Merda! Merda! – ecoa na minha cabeça.

E, de repente, uma canção de Zeca Afonso, “Os Vampiros”, alerta-me para os novos tempos que aí vêm, mais rápidos, mais vorazes, mais desumanos, menos solidários, e os perdedores, os da manada, com a voz cada vez mais calada.


No céu cinzento sob o astro mudo
Batendo as asas pela noite calada
Vêm em bandos com pés de veludo

Chupar o sangue fresco da manada
Se alguém se engana com seu ar sisudo
E lhes franqueia as portas à chegada

Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

A toda a parte chegam os vampiros
Poisam nos prédios poisam nas calçadas
Trazem no ventre despojos antigos
Mas nada os prende às vidas acabadas
São os mordomos do universo todo
Senhores à força mandadores sem lei
Enchem as tulhas bebem vinho novo
Dançam a ronda no pinhal do rei

Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

No chão do medo tombam os vencidos
Ouvem-se os gritos na noite abafada
Jazem nos fossos vítimas dum credo
E não se esgota o sangue da manada
Se alguém se engana com seu ar sisudo
E lhe franqueia as portas à chegada

Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

Vírus

Para que ninguém estranhe o silêncio, informo os leitores que fazem o favor de passar por aqui que a minha escrita foi atacada por um vírus – do tipo daqueles que, por vezes, atacam os discos dos computadores, pegam nos endereços electrónicos armazenados e disparam mensagens de todo o tipo em todas as direcções e sentidos... O vírus da preguiça.

Não sei como o contraí, mas desconfio. Desde que soube que o site da Câmara Municipal do Porto começou a citar “fontes próximas do JN” nunca mais fui o mesmo…